Entenda os Modelos de Propagação e como o modelo caótico determinístico pode revolucionar a previsão de cobertura

Quando falamos em radiodifusão e comunicação sem fio de longo alcance, prever com precisão a área de cobertura de um sistema de transmissão é um desafio técnico essencial. Essa tarefa, embora complexa, é vital para reduzir custos, otimizar recursos e garantir que o sinal chegue ao público com qualidade e estabilidade.

É nesse contexto que entram os modelos de propagação — ferramentas matemáticas que simulam o comportamento das ondas eletromagnéticas no ambiente, do transmissor até o receptor.

O que são modelos de propagação?

Modelos de propagação são equações ou algoritmos que estimam como um sinal se comporta ao se propagar por diferentes ambientes: rurais, urbanos, montanhosos ou densamente urbanizados. Eles ajudam engenheiros a prever a intensidade de campo do sinal recebido em diferentes pontos, antes mesmo da instalação dos equipamentos.

Modelos clássicos, como Longley-Rice, Okumura-Hata e ITU-R P.1812-3, são amplamente utilizados na indústria e aplicam conceitos como linha de visada, reflexão, difração, refração e dispersão troposférica. No entanto, essas abordagens têm limitações quando precisam lidar com fenômenos imprevisíveis — como o multipercurso e o ruído impulsivo.

Os desafios do multipercurso e do ruído impulsivo

Durante o trajeto da transmissão, a onda eletromagnética sofre interferência de obstáculos como prédios, montanhas, vegetação e até o relevo urbano. Isso gera o efeito multipercurso, que ocorre quando múltiplas versões do mesmo sinal (refletidas, difratadas ou refratadas) chegam ao receptor em diferentes tempos e fases. Esse fenômeno pode interferir negativamente na qualidade da recepção, principalmente em sistemas digitais.

Outro fator crítico é o ruído impulsivo, que aparece como picos aleatórios de energia no sinal, gerados por fontes como motores, ignições e interferências eletromagnéticas. Ambos os efeitos apresentam comportamentos não lineares e imprevisíveis, o que dificulta sua representação por modelos estatísticos tradicionais.

Uma nova proposta: o Modelo de Propagação Caótico Determinístico

Na tese de doutorado de Alberto Leonardo Penteado Botelho (2024), foi proposto um novo modelo: o Modelo de Propagação Caótico Determinístico. Essa abordagem utiliza sistemas dinâmicos caóticos para modelar o comportamento irregular e imprevisível do multipercurso, do efeito Doppler e do ruído impulsivo.

“A proposta é representar as incertezas da propagação de ondas eletromagnéticas de forma mais próxima da natureza, simulando os efeitos não gaussianos com sinais caóticos”, afirma Botelho em sua tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica e Computação da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Como funciona esse modelo?

A estrutura do modelo considera quatro efeitos principais:

  1. Multipercurso estático caótico;
  2. Efeito Doppler caótico;
  3. Ruído aditivo gaussiano (AWGN);
  4. Ruído impulsivo caótico.

Os três primeiros são modelados com o uso de funções caóticas, como o mapa de Hénon e o mapa tenda, que introduzem variações imprevisíveis no comportamento dos sinais. Isso torna a simulação mais próxima da realidade observada no campo.

Resultados: mais precisão, menos custo

O modelo foi testado em sistemas DVB-T2 — padrão utilizado na segunda geração da TV digital — em ambientes urbanos e rurais. A simulação demonstrou que o novo modelo reduz significativamente as áreas de má recepção, quando comparado com métodos tradicionais, como o Monte Carlo. Como consequência, menos retransmissores são necessários, o que implica em economia de tempo e recursos na instalação de sistemas de radiodifusão.

Com o crescimento da demanda por espectro e a chegada da TV 3.0, modelos de propagação mais precisos e alinhados à realidade do ambiente tornam-se cada vez mais estratégicos. O Modelo de Propagação Caótico Determinístico representa um avanço relevante ao oferecer uma alternativa mais fiel ao comportamento natural das ondas de rádio e TV.

Para empresas e engenheiros da área, essa abordagem pode significar melhor cobertura, menos interferência e mais eficiência nos projetos de transmissão.

Referência:
BOTELHO, Alberto Leonardo Penteado. Modelo de Propagação Caótico Determinístico. Tese Doutorado em Engenharia Elétrica e Computação – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2024.